Autora: Eduarda Chacon
Demi Getschko, presidente do NIC.br (O Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR) e membro do Comitê Gestor da Internet no Brasil, foi uma das muitas vozes na audiência pública realizada pela Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados, no último dia 18 de maio de 2016, sobre a polêmica da adoção - ou não - do modelo de franquia limitada para a internet de banda larga no Brasil.
O interessante sobre o pronunciamento de Getschko - e é por isso que abro meu texto falando nele - foi que saiu do padrão que se tem adotado a respeito do assunto: “discordo porque não” e “concordo porque sim”.
Demi Getschko, aliás, trouxe uma metáfora muito interessante. Segundo ele, é despiciendo falar – como se tem feito – em conteúdo quando se discute franquia de internet fixa porque as operadoras não produzem material algum, apenas transmitem. Os provedores de internet seriam como "canos" e os conteúdos seriam como os "líquidos" que circulam nas tubulações.
Ele defendeu a não limitação porque, segundo esta representação dos canos, toda a tubulação já está, afinal, à disposição dos provedores (vez que estes são os próprios canos) e o conteúdo está perfeitamente acessível a eles, bastando que ajustem a velocidade do tráfego ao transportarem o líquido de uma ponta (origem do conteúdo) até a outra ponta (consumidor do conteúdo).
É fundamental abrir um parêntese aqui para ressaltar que não entrarei no mérito importantíssimo da equivalência ou não entre a velocidade contratada e a velocidade efetivamente entregue aos usuários da banda larga. Com isto em mente, prossigamos.
Quer dizer: para Getschko, fechar ou interromper este "fluxo" seria arbitrário (por parte das operadoras) e apenas uma forma a mais de exercício de controle (em proveito delas), considerando que hoje já comandam a velocidade com que o conteúdo é entregue (e não haveria porque gerirem ainda em que quantidades).
Em outras palavras, o líquido fluir não afeta a “vida” do provedor em nada. Na prática, segundo (a minha compreensão de) Getschko, uma mudança no modelo só serviria para os provedores instalarem um hidrômetro que ficasse ali, controlando o volume de líquido, sem nenhuma finalidade “útil”.
Partindo do pressuposto de que Getschko esteja correto e que, de fato, não exista uma razão técnica para a instituição das franquias como, por exemplo, uma eventual incompatibilidade entre demanda e capacidade operacional (tratarei desta hipótese adiante), a motivação das operadoras para a instituição da franquia seria, necessariamente, aumentar a rentabilidade do negócio.
Muito bem. Peço que segurem esse raciocínio [em defesa do “não”] – ele será importante adiante.
O resultado mais interessante da audiência pública, ao menos para quem não pôde participar do debate pessoalmente, está sendo o ensejo de comparar os argumentos contrários e favoráveis pela primeira vez com maior clareza e objetividade.
Confesso que estava tendo dificuldade em localizar na mídia manifestações nos dois sentidos que fossem além do "porque sim" ou "porque não". Vejam bem: nunca faltaram pronunciamentos fervorosos em ambas as linhas, mas faltam argumentos bem pontuados e alicerçados que sejam convincentes lógica e tecnicamente. E, nisso, eu me perguntava: se as pessoas defendem ambas as posições tão passionalmente, quais as justificativas (ou reais interesses) delas?
Luís Oswaldo Grossmann escreveu uma série de artigos em resposta ao citado evento realizado na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados. Em um destes textos, relatou que a Vivo e a Claro alegaram, como argumento em prol da limitação, que apenas 2% de seus clientes usam 20% ou mais da capacidade da internet e que não se pode vender como ilimitado o que é limitado.
Na mesma matéria, Grossmann afirmou que Carlos Duprat teria explicado que, como está hoje, alegoricamente, “a moto paga igual à jamanta”, referindo-se aos usuários que consomem pouco e acabam arcando com os custos do consumo daqueles 2% do parágrafo anterior.
Em suma, a advocacia da limitação pelas empresas opera em duas frentes, uma técnica e uma ética: limitação da capacidade da internet e isonomia (no sentido de tratar igualmente aos consumidores iguais e desigualmente aos desiguais).
Até agora, vejam bem, as ponderações das partes manifestantes parecem bastante razoáveis.
Daí, a ANATEL se pronunciou, consoante retrata o mesmo repórter, afirmando que impedir o modelo de franquia poderia matar a telefonia celular pré-paga.[3] Será?
Improvável. De todo modo, teve início um debate em paralelo.
O raciocínio é o seguinte: um grupo de pessoas defende que o Marco Civil veda o modelo de franquia porque só pode haver bloqueio de serviço mediante falta de pagamento, leia-se: na data do vencimento da fatura.
Para se opor a esse grupo, a ANATEL e os apoiadores da limitação da banda larga afirmaram que o pré-pago é um modelo de contratação por quantidade (limitado, análogo à franquia) e, como tal, sofre bloqueio por uso de volume máximo de dados, não por falta de pagamento.
A pretensão da ANATEL é forçar ao entendimento de que ou o Marco Civil libera tanto a internet pré-paga quanto a franquia de banda larga, ou veda obrigatoriamente aos dois.
Quer dizer, a ANATEL está dizendo que a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) não é incompatível com o pré-pago (utilizado por 80% dos consumidores no setor) porque, ali, está expressamente prevista a exceção de que o bloqueio pelo não-pagamento só se aplica quando o serviço é contratado por prazo (mensalidade, isto é, no pós-pago).
No caso da internet, todavia, a ANATEL defende que o Marco Civil deveria ter feito a mesma ressalva da LGT afirmando que o bloqueio por não-pagamento só se aplicaria para os planos mensais (dizendo “olha, pode pré-pago”) e, como não fez, estaria proibindo a modalidade.
A única maneira de evitar essa proibição, segundo a ANATEL, seria a adoção da interpretação/política favorável à franquia, permitindo a limitação de quantidade de dados na internet em qualquer das duas situações.
Com isso, a ANATEL espera incentivar os partidários do movimento contra-franquia a recuarem, sob pena de a internet pré-paga se tornar inviável. Mas o fato é que este não me parece o caminho mais persuasivo.
Do modo como vejo, quando a internet pré-paga deixa de funcionar, o que ocorre, verdadeiramente, é um bloqueio por falta de pagamento. E, sinceramente, quando a internet móvel pré-paga deixa de funcionar também é por falta de pagamento.
Explico: o usuário deposita um crédito (pagamento); quando o crédito acaba, o serviço deixa de funcionar (é cortado), por falta de crédito (pagamento).
Esta é precisamente a orientação do Marco Civil e da LGT: cortar o serviço APENAS por falta de pagamento. O pré-pago se diferenciaria, assim, de ambos os modelos mensalistas, tanto móvel quanto fixo, embora o primeiro seja por franquia e o segundo seja por velocidade. O pré-pago, destarte, seria uma terceira categoria.
Na minha opinião, portanto, a ANATEL está fazendo muito barulho, e criando um confronto paralelo, por nada. Como é comum às lides paralelas, aliás, o prolongamento lateral do debate costuma mais protelar a questão do que apresentar uma solução.
Voltemos sem mais tardar, pois, ao impasse a respeito do tema principal que é a instituição da limitação de dados na internet fixa.
Pensando sob o ponto de vista estritamente capitalista, sempre me pareceu razoável que como regra quem use mais, pague mais. Coincidentemente, neste caso, esta ideia vai de encontro ao argumento ético das operadoras sobre proporcionalidade e (des)igualdade de consumo e pagamento. Por outro lado, opiniões às quais respeito profundamente continuam se opondo a esta lógica para defender a internet ilimitada.
É aí que a metáfora do Getschko vem a calhar. Voltemos a ela.
O modelo atual de internet de banda larga no Brasil funciona da seguinte forma: o usuário contrata a tubulação (internet) de acordo a sua necessidade ou desejo de eficiência para o recebimento do líquido (conteúdo). A obtenção não interessa a essa relação. Também não importam volume, distância ou frequência com que ocorrerá a transferência de uma ponta (origem) à outra (consumidor/usuário) por meio dos canos (provedores).
Concretamente, contrata-se uma garantia de maior ou menor agilidade.
O que ocorre é que dado consumidor pode optar por uma velocidade extremamente rápida e transportar uma quantidade irrisória de dados; enquanto outro pode achar por bem transmitir uma quantia excepcional de dados a uma baixa velocidade. Ou a variação pode ser relativa à frequência: um consumidor utilize a rede 24h/7d enquanto outro use-a eventualmente. E há a cumulação entre estes fatores.
Em qualquer combinação de variantes, os preços pagos sãos os mesmos, a depender apenas da velocidade contratada.
Quando uma operadora não se conforma que seu cliente pague pouco - contrate uma baixa velocidade - e transporte muito - carregue demasiados dados, ela está correta. Sim, porque trata-se de atividade privada e não de filantropia.
O interesse de policiamento de volume de conteúdo com propósito de lucratividade não é, a meu ver, absurdo. Não, na medida em que a operadora é refém de seus próprios pacotes de velocidade – e os usuários também são – sem poder ajusta-los às necessidades individualizadas de cada um.
Eu não acho que se trate de uma manobra das operadoras para limitar conteúdo. Se alguém quiser limitar conteúdo, somente quem tem esse poder, com ou sem franquia, são as pontas – origem e destinação – mediante contratação, acordo, pagamento, etc. (seriam escritórios, jornais, revistas, pessoas, blogs, canais, sites, etc., que podem vender, dar, negociar, limitar, e controlar o acesso aos dados que interessam ao usuário consumidor).
Os provedores, na condição de canos por onde trafega o conteúdo, poderiam até “fechar o registro”, mas seria um comando meramente mecânico sem nenhuma força sobre os dados em si. O mais próximo de influência sobre conteúdo por parte das operadoras são os acordos de Zero Rating e Fast Lane, este último já proibido é o primeiro sob debate. Nesta linha, concordo com Getschko sobre abolir conteúdo da discussão.
(Parêntese)
Sobre Zero Rating, não se sabe ao certo se a prática estaria proibida com o novo Decreto – o que já ficou esclarecido, em consenso satisfatório, foi a proibição do chamado Fast Lane. [4]
O Zero Rating é aquele serviço comumente veiculado em propagandas de operadora de internet móvel que prometem acesso a determinados aplicativos sem desconto na franquia de dados do usuário (grátis) [5]. Já quando uma empresa oferece internet patrocinada (como é comum em aeroportos), não se definiu ainda se esta prática se enquadraria como Zero Rating.
No cenário global, a União Europeia teria aprovando a prática desde 2015 [6]; enquanto Estados Unidos e Canadá irão rever as regras que permitem o artifício.
A razão de invocar o Zero Rating quando se discute franquia na internet de banda larga fixa, é que a tendência predominante no Brasil, por enquanto, parece ser pela aceitação desta prática, mesmo com o Decreto. Sendo assim, trata-se de um pequeno gesto de não-limitação dentro do limitado mundo da internet móvel.)
Voltando à metáfora dos canos, a internet móvel pós-paga é um sistema no qual o usuário paga pela circulação (tráfego) de uma quantidade ou franquia LIMITADA de líquido (dados) pelos canos (operadoras) mensalmente, sem opção de escolher velocidade. Ponto. Final.
Significa que na internet móvel pós-paga só existe UM critério que é a quantidade contratada de dados, renovada mensalmente mediante pagamento.
Observe-se que a internet fixa – relembrando – é um modelo onde se paga pelo uso da tubulação para o transporte LIVRE de líquidos mensalmente com opção da velocidade do trânsito. Isto é, na internet de banda larga existe UM critério que é a velocidade contratada para o tráfego, também renovada mensalmente mediante pagamento, e que, diferentemente da internet móvel, não se exaure ao longo do mês.
A implementação de franquia na internet de banda larga iria, na prática, fundir os dois sistemas, de modo que o usuário teria que contratar um pacote de dados somado a uma velocidade de tráfego.
A questão é: de que modo isto seria implementado?
Ainda não me considero satisfeita quanto à profundidade dos argumentos que encontrei ou à variedade deles. Nada obstante, não me alinho àqueles que defendem a limitação da internet de banda larga e, tampouco àqueles que são contra. Sigo o caminho do meio.
Acho que o modelo atual da internet de banda larga é bom, mas que pode ser aprimorado. Penso assim por dois motivos, o primeiro técnico e o segundo ideológico:
No regime privado – no qual o serviço de internet se enquadra hoje e deverá permanecer - não há espaço para filantropia. Deste modo, não acho razoável um consumidor transportar grandes volumes de dados diariamente no Netflix e pagar o mesmo que outro que mal usa a rede.
Quando instalei internet fixa na minha casa, somente uma empresa tinha cobertura na área - e estou falando de uma quadra do Plano Piloto de Brasília. Esta única empresa tinha uma única velocidade disponível. Eu, como usuária, preferiria poder optar por uma velocidade que me servisse melhor - e por que não contratar também uma franquia de dados? E minha linha móvel pós-paga não me atende e não vivo perfeitamente bem com minha escolha?
O que interessa são os propósitos e os porquês.
Como eu disse a antes, as operadoras têm duas justificativas, uma moral e uma técnica. Nenhuma das duas me atende.
Quanto à técnica eu respondo o seguinte: “não é problema meu, consumidora”. Quanto à moral, deixo para o debate acadêmico, mas não lhe atribuo credibilidade como razão legítima para a operadora se mobilizar por uma mudança no modelo da internet fixa.
Se a razão for financeira, como insinuou Getschko, eu respeito. E se for servir para aprimorar e ampliar a qualidade e a cobertura da rede, excelente (insisto, contudo, que isso é problema das operadoras, justamente por se tratar de serviço privado).
A respeito das restrições e incapacidades técnicas que serviriam de justificativa para a limitação da internet, compreendo que não se pode adivinhar os cenários do futuro, mas vivemos hoje sob os auspícios da revolução da IoT e da inteligência artificial que se anuncia com o Amazon Echo e o Google Home, por exemplo.[9] Portanto, é apenas natural que os usos e capacidades da internet fixa sejam projetados muito além do mais vanguardista que se possa antecipar[10].
“O estudo Cisco Visual Networking Index (VNI), divulgado nesta terça-feira, 07/06, revelou um dado que pode fazer a diferença na discussão sobre franquia de dados na banda larga fixa no Brasil.
Segundo a Cisco, o consumo médio de banda por usuário era de 15,8 GB por mês, em 2015, e passará para 32,5 GB em 2020” (Prescott, Roberta. Banda larga fixa: Consumo de dados no Brasil vai pular de 15.6 GB para 32.5GB até 2020. Convergência Digital)
Nada obstante, aqui estamos nós, nos lamentando de nosso reduzido potencial e pensando em restringir o uso da rede. Me preocupa que achem que a resposta é nos adequarmos ao problema ao invés de vencê-lo.
Particularmente, me parece que o Brasil está focando sua energia em regular o presente enquanto feitos extraordinários se anunciam no horizonte digital e eletrônico. Imagino que ignorar o potencial das mudanças seja mais fácil do que admitir (certa) incompetência em se antecipar a elas, mas aí está a beleza da internet: ninguém espera que seja possível a antecipação, pelo menos não em termos regulatórios.
Assim, mesmo que a franquia não afete significativamente a vida operacional das operadoras, penso que traria mudanças financeiras razoáveis e que não interferiria no controle sobre conteúdo em si – que continua com os originadores e usurários – mas apenas aumenta o poder sobre o trânsito dele – com exceção da polêmica a respeito do Zero Rating, a ser definida.
De todo modo, o poder de bloqueio por interrupção do tráfego sempre existiu, só não é hoje institucionalizado; do mesmo modo que uma operadora pode facilitar acesso ou dar acesso gratuito ou subsidiado, também pode bloquear, como se viu no Brasil com a ordem judicial sergipana a respeito do WhatsApp.
Este recurso (bloquear) igualmente tem o originador do conteúdo, só que de ao invés de parar o tráfego, como faria o provedor, pode interromper a distribuição (cortar no fornecimento) e até o possui o próprio usuário que pode se negar a receber determinados conteúdos.
Neste caso, a franquia não cria um poder, apenas o regulamenta. Se é assim, em sentido estrito, a franquia mais limita do que amplia a autoridade da operadora sobre o conteúdo.
Consideremos o serviço prestado pelos Correios.
O remetente que se dirige a uma agência dos correios precisa submeter o pacote a uma pesagem (limitação de volume) e depois optar por um tipo de remessa – PAC, SEDEX, SEDEX 10, etc. – que determinam o tempo aproximado da entrega (velocidade). É um sistema híbrido.
Com a internet fixa, o nó da questão seria garantir que os pacotes fossem excepcionalmente generosos, considerando que a demanda de banda larga é muito mais exigente do que a da internet móvel.
Os números iniciais oferecidos pela por uma das operadoras foram a partir de 10GB, com velocidade de 200kb/s, a 130GB, com velocidade de 20Mb/s, por mês. Me corrijam se eu estiver errada, mas estes me parecem valores irrisórios para representarem, proporcionalmente, o consumo mínimo e máximo.
Rodrigo Ghedin escreveu em 04 de março de 2016 um artigo intitulado “Quantos gigabytes uma pessoa gasta, por mês, numa conexão de banda larga fixa”. Indo direto ao ponto, Ghedin, que mora sozinho e é um consumidor padrão/padrão-alto (usuário de smartv, tablet, smatphone, redes sociais, Netflix, Youtube, Spotify) calculou seu consumo mensal em 150GB, 5GB por dia.
Ghedin ressaltou ainda que pelo padrão do IBGE uma família média de 3,34 pessoas residentes no mesmo domicílio que tenham, cada uma, metade de seu consumo, ainda assim teriam ao final do mês utilizado 225GB.
Aproveito para abordar o conceito de heavy users como internautas que consomem acima da média, seja por escolha pessoal, por necessidade profissional ou por ambas as razões. É bom esclarecer que a franquia não visa punir ninguém[13] porque ser usuário pesado não é ilegal, imoral nem injusto. Este discurso de punição é equivocado pelo simples fato de que o serviço de internet está à venda e é livremente negociado, não está sendo usado gratuitamente.
Ora, se a contratação não estabelece limites, não há limites. Logo, não existe abuso. O que precisa ser feito, como dito antes, é uma adequação do serviço ao perfil individual dos consumidores, mas não por punição, sim por observância à natureza do livre mercado que pressupõe a busca pelo lucro em contrapartida ao aprimoramento do serviço ou produto).
Sem atentar neste texto para a questão da definição e fiscalização da velocidade, falta às operadoras mais reflexão sobre as ofertas de franquias de dados. Na prática, não tenho certeza de que seria necessário um pacote com dados ilimitados, o que é imprescindível e inegociável é um plano coerente com as necessidades reais dos assinantes. Estou falando aqui de pacotes que variem em torno de 50GB a 1TB para pessoas físicas, com valores diferenciados (maiores, claro) para pessoas jurídicas e, talvez, uma política especial para adequação à realidade do home office e de heavy users.
Frise-se que ninguém está discutindo custos e preços. O custo e o preço são inerentes a fatores como esforço, benefício, evolução, escassez e a uma série de elementos que não convém listar. Com isto em tela, as operadoras devem compreender que os planos de franquia não podem refletir a limitação da infraestrutura da rede (que deve ser ampliada com os recursos auferidos com a mudança no sistema), mas sim espelhar a real demanda e o gasto médio efetivo dos usuários.
Despiciendo dizer que a velocidade deverá ser coerente com o volume de dados potencialmente trafegável, ou seja, com uma capacidade da taxa de transferência viável.
Lembrando ainda que a norma do art. 63 da Resolução nº 614, de 28 de maio de 2013, que aprovou o Regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia - SCM, disciplina a franquia, reconhecendo-a por implicação lógica. Significa que quanto a proibir limitação de dados via franquia, Inês é morta.
O ponto aqui é reconhecer como mais prático tentar encontrar modelos aceitáveis para a franquia de internet fixa que virá - não nos enganemos - do que tentar uma repressão a ferro e fogo.
Em nome da retórica, o Comitê Gestor da Internet aprovou uma resolução no dia 03 de junho a respeito do debate que se limita a duas sugestões e não traz qualquer posicionamento ou argumento técnico:
[O Comitê] RESOLVE
Afirmar que qualquer decisão a respeito do atual debate sobre franquia de dados na banda larga fixa no Brasil deve ser embasada por estudos técnicos, jurídicos e econômicos com validade legal, teórica e empírica, observando-se também a experiência internacional a respeito;
Recomendar que a ANATEL, a SENACON, o CADE, o CGI.br, associações de usuários e empresas, provedores de acesso e operadoras de telecomunicações, todos colaborativamente em prol do desenvolvimento da Internet no Brasil, busquem, inclusive por meio de consultas públicas, soluções que atendam de forma equilibrada aos diversos segmentos atingidos.
Talvez em resposta ao ambiente bélico, a Anatel decidiu (o que é muito positivo) abrir um processo de análise técnica a respeito do tema que incluirá reuniões públicas com o governo (Fazenda, Justiça, MCTIC), os provedores (Abranet, Abrint), os consumidores (Proteste, Idec), a OAB, o CGI.br, o Ministério Público e as operadoras (Sinditelebrasil).
Desde já, me assumo favorável à franquia da internet fixa, embora por motivos diversos dos que me foram apresentados e com um formato bem diferente do incialmente proposto pelas operadoras. Penso eu que está faltando ao debate perspectivas novas que projetem uma luz sobre a tela revelando o que está oculto à vista de todos: a necessidade da evolução do modelo de banda larga.