Autor: Cristian Gallegos, Professor, palestrante e sócio diretor da Simbiose Tech Ventures
Frequentemente, ao explicar quais iniciativas em big data estão em curso, sobretudo, com relação a marketing e customer behavior, impressionadas, as pessoas costumam usar o termo “magia”. Nesse momento, cabe muito bem a célebre frase de Arthur C. Clark, autor de 2001- a Odisséia no Espaço: “Qualquer tecnologia suficientemente avançada, é indistinguível de magia”*.
Agora, para que esta “magia” gere valor para nosso dia-a-dia, para que se torne algo palpável e passível de receber atenção e investimento, há quesitos que devem ser atendidos, são eles: propósito, tecnologia, dados, capacidade analítica e natureza acionável.
Propósito
O termo é novo, mas o conceito, antigo. Desde que a produção em massa ditou o ritmo da comunicação, o marketing corre atrás do prejuízo em busca do equilíbrio da sua essência: aquela, do dono da quitanda que conhecia perfeitamente a sua clientela, sua história, preferências e demandas. Com isso, conseguia oferecer o produto certo, de forma apropriada, à pessoa certa no momento mais adequado. Irresistível! Pois bem, desde então temos feito malabarismos com o marketing direto, CRM, Business Intelligence dentre tantos outros meios e tentativas de reaproximar as empresas dos clientes e reatar o relacionamento. Apesar de terem apresentado avanços, faltava a tecnologia que viabilizasse realizar algo em amplo espectro.
Recentemente tive o prazer de assistir a uma palestra de Peter Diamandis, fundador da Singularity University e autor do livro “Abundância – o futuro é melhor do que você imagina” e umas de suas frases marcantes foi "...vistos pelas lentes da tecnologia, poucos recursos são realmente escassos." Isto é, se temos a meta (objetivo), a motivação e os recursos necessários (cérebros brilhantes e investimento) - chegaremos lá. E isto se aplica perfeitamente ao cenário de relacionamento com os clientes e o big data, portanto existe um propósito legítimo.
Tecnologia
O fato de nos vermos surpreendidos pelo ritmo da evolução tecnológica tornou-se uma constante Recentemente vimos o surgimento do cloud computing, das telas ultrafinas de altíssima resolução, da sensibilidade ao toque, da análise semântica e, mais tecnicamente, NoSQL (Not Only SQL) em conjunto a inovações em processamento e tratamento de dados que permitem que consigamos trabalhar com quaisquer tipos de dados e origens para gerar insight – enfim, o big data. A tecnologia tornou-se acessível em todas as dimensões, principalmente econômica. Com algumas centenas de dólares, qualquer empresa tem acesso a tecnologias fantásticas, basta saber o quê fazer com elas.
Tenho passagem por diversas empreitadas em tecnologia, a complexidade no sentido amplo da palavra é uma constante. A questão é definir quem é o responsável por lidar com ela: os provedores de soluções ou seus clientes? Quando surgem novas tecnologias, é muito comum que sejam de técnicos para técnicos. Isto é, ficam restritas às empresas “early adopters” que possuem maior tolerância a riscos com equipes capazes de mastigar desafios técnicos a fim de obter vantagens antes das demais. Por este motivo, estas tecnologias ficam pouco acessíveis à grande massa das empresas. Com o amadurecimento e consolidação, uma outra etapa tem início, a de “simplificar” a utilização “moendo a complexidade” e entregando valor e solução ao mercado. Entendo que o big data esteja neste momento de transição, onde a entrega de valor seja o foco, e não somente a utilização da tecnologia por si só.
Há soluções diversas que utilizam big data no mercado de seguradoras, financeira e de pesquisa, no entanto, são recentes as soluções voltadas ao mercado de marketing que possam ser usadas em maior escala, sem que fique restrita a poucas empresas com grande capacidade de investimento e exércitos de desenvolvedores e estatísticos. Como exemplo temos o caso das DMPs (Data Management Platforms), das ferramentas de Análise Semântica, de sentimento e Analytics em geral – sempre considerando o quesito “tempo real” como fundamental, onde há um grande desafio.
Dados
Com frequência tenho acompanhado casos de empresas que cobiçam dados do mercado, mas sem antes valorizar as informações que possuem em de casa. Não me refiro tão somente aos dados básicos de cadastro de cliente, histórico de cobrança ou atendimento – o que, na grande maioria, já é um enorme desafio cruzar e extrair insights. Refiro-me a dados que estão ao alcance da mão, mas simplesmente não são coletados como, por exemplo, perfil de navegação, de consumo de conteúdo e de interação com a empresa, site e etc.
Dados obtidos de observação são tão, ou mais, valiosos que dados extraídos de pesquisas. A frase icônica “Seus atos falam tão alto, que não ouço o que você diz” exemplifica muito bem o abismo existente entre uma pesquisa respondida pelo cliente, sob a pressão da atmosfera social, e o registro do hábitos/atos (fatos) do comportamento daquele cliente. Poucos admitem que ouvem música brega, mas poucos são os que mudam o dial do rádio quando aquela bem conhecida começa a tocar – foi o que comprovou uma pesquisa apresentada no livro “O Poder do Hábito” de Charles Duhigg. Leitura sugerida.
As empresas denominadas “data-driven” possuem a característica de registrar todos os dados possíveis, mesmo que naquele momento alguns deles possam não fazer sentido. O acesso a dados tem se tornado o grande desafio de muitas empresas, pois é o insumo vital para todo o restante do big data. A boa notícia é que todo e qualquer dado pode gerar valor: desde o básico CRM, histórico de atendimento, registro de cobrança, comentários em mídias sociais a sofisticados registros de dados para mapeamento de comportamento (customer behavior) com monitoramento de navegação web, conteúdos consumidos, registro de sensibilidade a tipos de persuasão. E há ainda um poderoso arsenal com a possibilidade de utilização de provedores de dados, os chamados, 3rd Data Providers. Nesta batalha, tudo é válido desde que tenha utilidade, isto é, desde que haja capacidade de análise a fim de gerar insights e, posteriormente, ações que se reflitam em resultados.
Capacidade Analítica e Preditiva
Os cientistas de dados estão em alta, e o marketing em cheque. Por muito tempo o lado analítico do marketing tem andado atrofiado, mas recebe agora uma injeção de hormônios e adrenalina. ROI é a tônica nas reuniões de alto escalão, provar o valor do marketing está na pauta dos CMOs, é o que apresenta a pesquisa “O que tira o sono dos CMOs?”** feita pela Adobe em agosto e setembro de 2013 com 1.000 profissionais de marketing de alto escalão.
Feita a lição de casa, teremos uma massa de dados e tecnologia suficientes para manipular e extrair bons insights se, e somente se, tivermos a inteligência de análise. Quando me refiro a inteligência, não falo somente de capacidade técnica analítica, o que um estatístico tem de sobra, mas sim o match com a visão de negócios e objetivos da empresa. Boas informações podem ser obtidas com correlação e regressão, mas não necessariamente implicam em causalidade. A causalidade demanda uma visão ampla e holística do negócio e do mercado. Um exemplo, sabe-se que pessoas que abastecem o carro entre as 15h00 e 17h00 tem mais chances de fazer um lanche uma hora depois. Informação sem alma, torna-se apenas curiosidade.
No entanto, mesmo assim, ao ser detectado um padrão, temos como gerar valor por sabermos que em X% dos casos, aquele consumidor que podemos não saber quem é e nem porque age assim, tende a consumir algo no período seguinte. Desta forma, abre-se uma janela de oportunidade. E aqui está o fechamento do grande ciclo, o acionamento da informação.
Natureza Acionável
O objetivo de entender o comportamento do consumidor está longe da mera curiosidade. No entanto, muitas iniciativas acabam congeladas ou simplesmente estancam no patamar do “conhecimento” sem que venham a representar um retorno claro e palpável para todo o esforço demandado, o que não está nada alinhado com a pressão por ROI.
Logo de início temos dois caminhos bastante claros para obter benefícios com uma iniciativa big data : a aquisição de novos clientes e a retenção dos existentes, caso a empresa esteja em estágio inicial. No entanto, os insight obtidos podem ser muito valiosos para aprimorar a performance de campanhas já em andamento, uma vez que, ao conhecer mais a fundo determinados segmentos de clientes, a comunicação pode ser mais útil, adequadamente persuasiva e, portanto, relevante.
Imagine o cenário ideal. Por exemplo, uma empresa de TV a cabo que consiga segmentar sua campanha online apenas para usuários que não sejam seus clientes, homens da faixa etária que costuma contratar o serviço, que tenham residência em áreas de cobertura da empresa e que sejam sensíveis a combos de esportes e filmes. E, assim, sejam impactados por banners dedicados com o apelo adequado. Sim, essa mistura perfeita de segmentação utilizando inúmeras fontes de dados e acionamento de campanhas para audiências bastante claras, é possível.