Autor: Gustavo Gusmão
Depois de meses de polêmicas e discussões e sessenta dias após ser sancionado pela presidente Dilma Rousseff, começa a vigorar nesta segunda-feira o Marco Civil da Internet. Redigido pelo deputado federal Alessandro Molon e elaborado de forma colaborativa, o projeto de lei esteve em pauta na Câmara desde 2011, pelo menos.
A legislação foi criada como forma de “consolidar direitos, deveres e princípios para a utilização e o desenvolvimento da internet no Brasil", nas palavras de uma cartilha do Comitê Gestor da Internet no país, o CGI.br. Segundo o texto, são três pilares principais, basicamente, os defendidos e protegidos pelo Marco: a Privacidade dos usuários, a Neutralidade da rede e a Inimputabilidade da rede – ou liberdade de expressão, como já dito por Molon.
Talvez a que mais gerou discussão, a primeira parte aparece nos artigos 7º, 9º, 10, 11 e 12, principalmente. Eles visam impedir o monitoramento e análise de conteúdos por parte dos prestadores de serviço e ainda garantir a proteção da intimidade – mesmo no caso do armazenamento de logs, tratado por Demi Getschko, um dos pais da internet no Brasil e diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR, o NIC.br.
O segundo ponto, por sua vez, tenta fazer com que nenhum tipo de tráfego seja privilegiado: “o responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação”, diz a lei. E o terceiro, por fim, já aparece para “estabelecer princípios básicos e garantir a aplicação do devido processo legal, quando necessário”, mas assegurando a liberdade de expressão, a privacidade e outros direitos individuais, segundo texto do CGI.br.
Histórico – A ideia do Marco Civil da Internet vem de bem antes de 2012, quando ele começou a ser discutido na Câmara. Ronaldo Lemos, hoje membro do conselho da Mozilla e diretor no Creative Commons Brasil, foi um dos primeiros a aparecer com a ideia de um marco regulatório para web, ainda em 2007. Em meados de 2009, a iniciativa começou a tomar forma, como um projeto colaborativo – opiniões e sugestões foram recebidas de todas as partes possíveis, fazendo da lei quase um “wiki”.
A partir do texto inicial, a legislação foi desenvolvida, e caiu nas mãos da presidente Dilma e na Câmara pela primeira vez em agosto de 2011. A aprovação, no entanto, levou quase três anos para acontecer, e foi acelerada pelas notícias de que agências de segurança norte-americana estavam espionando políticos daqui.
O texto que chegou aos deputados pela última vez, redigido por Molon, ainda saiu da Câmara com algumas leves modificações apesar da aprovação. Os três pilares mencionados acima foram preservados, como dá para ver (NESSE LINK). Mas a ideia de trazer todos os dados dos internautas brasileiros para o país, por exemplo, acabou deixada de lado, para ser discutida posteriormente – e até com certa razão, já que as empresas atuantes no Brasil teriam bastante trabalho para trazer e instalar servidores por aqui.
Mesmo com as modificações, o deputado federal responsável pelo projeto se mostrou satisfeito com o texto final, que foi ao Senado e ainda sofreu algumas mudanças também leves – às autoridades que têm permissão para acessar os tais logs dos internautas, foram adicionados delegados de polícia e membros do Ministério Público, por exemplo.
Foi esse o projeto que chegou às mãos de Dilma, que o assinou durante o Encontro Global Multissetorial sobre o Futuro da Governança da Internet, o NETMundial. O evento, realizado no final de abril deste ano, reuniu em São Paulo “representantes de governos, sociedade civil, técnicos e usuários da rede de vários países”, o que colaborou para aumentar a visibilidade do projeto pelo mundo.
Apoio – Desde a criação da iniciativa, o Marco Civil da Internet recebeu apoio de nomes de peso. Os mencionados CGI.br e Ronaldo Lemos foram dois deles, sendo acompanhados dos Ministros das Comunicações, Paulo Bernando, da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp, e da Justiça, José Eduardo Cardozo, além de ativistas da internet e defensores da web aberta. Nomes ainda maiores, como o de Tim Berners-Lee – pai do WWW –, e de empresas enormes como Facebook, Google e Microsoft, também foram favoráveis à decisão – e ainda comemoram a aprovação.
Futuro – Mas o que ainda há por vir? No caso do Marco brasileiro, as discussões devem agora girar em torno dos pontos polêmicos, como ressaltou, em entrevista, Demi Getschko. Ou seja, emendas para definir as autoridades que terão acesso aos logs armazenados pelas páginas, por exemplo.
Fora daqui, outros países podem começar a pensar em uma legislação própria voltada para a web, exatamente como fez o Brasil, admirado no exterior pela iniciativa. E se não o fizerem de “boa vontade”, talvez tenham que criar algo por necessidade – vide o caso dos EUA, que ainda discutem para definir se o conceito de neutralidade da rede vale ou não lá dentro. E para o futuro, passadas as polêmicas e definidas as legislações, também existe a possibilidade de um Marco Civil mundial, uma ideia que ainda é considerada inviável.
FONTE: CorpTV
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